Antes de abordar a circularidade em Matemática, vejamos o que seja definição circular. A definição circular é dada por um enunciado no qual se define um conceito usando o próprio conceito na tentativa de definir. Em outras palavras, ele assume um entendimento prévio de termo que está sendo definido. Neste tipo de definição, o termo a ser definido é incluído como parte da definição e, por isso, a definição circular é caracterizada como um caso especial de falta de clareza no qual não fornece informação nova ou útil.
Na Matemática, a circularidade ocorre quando se quer construir “algo”, entretanto, a existência desse “algo” já é tomado a priori, isto é, antes da construção. Por exemplo, a maioria dos livros didáticos introduz os números reais através da seguinte circularidade: os irracionais são números que não são racionais e o conjunto dos reais é a reunião dos racionais com os irracionais. Neste caso, se mantém a crença da existência prévia de um conjunto.
A circularidade em Matemática ocorreu também no decorrer da História dessa ciência. Baldino coloca que quando Gauchy define os números irracionais como um limite de uma seqüência de números racionais, ele cai numa circularidade, uma vez que dizer que uma seqüência de números racionais converge para um limite – número irracional -, por definição de limite, esse número pré-existe. Nesta análise feita por Baldino, o autor faz uma analogia às categorias de lugar e presença de forma que “algo” que se pensava como número estava presente no lugar para onde a seqüência convergia como que à espera que a convergência se consumasse. Para Baldino, a seqüência apenas indicava o lugar para onde certa presença, conceitualmente distinta dela e construída anteriormente a ela.
Outro caso de circularidade em Matemática está na definição de número racional ou irracional proposta por Dedekind através do conceito de cortes. Para Dedekind, um corte na reta real produz duas classes (subconjuntos): A e B de tal forma que seja um elemento α∈A e um elemento β∈B é possível fazer com que a diferença entre esses elementos, isto é, α-β diminua quantas vezes se queira. Neste caso, têm-se duas possibilidades: o conjunto A possui supremo ou o conjunto B possui o ínfimo. Em qualquer uma das possibilidades anteriores temos, então, um corte racional; o contrario disso é termos um corte irracional. Baldino coloca que a circularidade permanece nessa definição, visto que na época da construção de cortes só existia números racionais e por esse caminho, os números irracionais é dado como conhecido e depois é construído um processo para construí-los. Em outras palavras, não poderia se utilizar os números irracionais e como isso aconteceu, o Dedekind caiu numa circularidade.
Na Matemática obedece a um princípio no qual os seus objetos devem ser construídos axiomaticamente e Dedekind quebrou esse principio, isto é, criou um obstáculo epistemológico, isto é, dificultou a compreensão do que seja número irracional e como conseqüência, acabou falsificando a Matemática.
Mas como a Historia da Matemática resolveu o problema da circularidade relacionada aos números irracionais? Segundo Baldino, a história da Matemática evitou a circularidade assumindo-a, isto é, quando a mesma compreendeu que, para construir uma presença no lugar que o processo indica nada mais se tem ao não ser o próprio processo. Em outras palavras, o número irracional é o próprio processo e não o lugar que o processo indica.
Sugestão de Leitura:
BALDINO, Roberto Ribeiro. A ética de uma definição circular de número real. Bolema. Rio Claro, a.10, n.9, p.31-52, 1994.
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